#20: Analisando alguns SPACs e IPOs no universo das fintechs (Parte 2)
W FINTECHS NEWSLETTER #20: 20/09-26/09
Olá,
Na nossa #20 newsletter da W Fintechs você encontrará sobre:
Ventos que guiam;
Analisando alguns SPACs e IPOs;
E, claro, as principais notícias da semana que passou.
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Na edição passada, contextualizamos como chegamos aos SPACs (Special Purchase Company). Do primeiro IPO do mundo — a Companhia Holandesa das Índias Orientais — às novas modalidades de empresas, o mundo se desenvolveu de forma espetacular e curiosa. Os SPACs estão por aí, garantindo crescimento à muitas startups — algumas ainda nem possuem produto no mercado. Na edição desta semana, focaremos em analisar o desempenho de alguns SPACs (e IPOs tradicionais) que vieram a público nos últimos meses.
Ventos que guiam
Nos últimos anos, houve um crescimento perceptível no número de SPACs. No mesmo período, tivemos algumas coisas interessantes acontecendo ao redor do mundo.
Taxas de juros negativas: o juro é, em essência, o custo do dinheiro, ou seja, a taxa cobrada é o preço cobrado do devedor pelo credor que disponibiliza os recursos. Em algumas partes do mundo, os juros foram (e ainda são) negativos. No Brasil, por exemplo, quando o juro básico (taxa SELIC) chegou a 2% ao ano, o país passou a ter oficialmente uma taxa de juro real negativa. Significava que quando descontávamos a inflação projetada em 12 meses da taxa nominal, o juro real estava negativo em 0,71%. Enquanto o brasileiro se acostumava com a realidade dos juros baixos, investidores na Europa e no Japão convivem com taxas de juros negativas há alguns anos. Após a crise financeira de 2008, que freou a atividade econômica global, os principais bancos centrais — dos Estados Unidos, Europa e Japão — reduziram drasticamente os juros básicos de suas economias para minimizar os efeitos da crise, com o principal objetivo de evitar que o dinheiro ficasse parado nos bancos. Em 2019, no Japão, a taxa estava em -0,1% ao ano. Na Suíça, no mesmo período, a taxa foi de -0,75% ao ano. Na prática, é como se a pessoa tivesse que pagar para investir seu dinheiro em títulos públicos.
Juros no Japão, Disponível aqui Crescimento de investimentos com maior exposição ao risco: com baixas taxas de juros ao redor do mundo, as classes de ativos com maiores exposições ao risco se tornaram destaque nas carteiras dos investidores mais arrojados. Em 2019, a Bolsa de Valores do Brasil, medida pelo IBOVESPA, principal índice da B3, atingiu os impressionantes 100 mil pontos, pavimentando uma nova trajetória no mercado de capitais brasileiro. Dois anos depois, já em pandemia, atingiu-se mais de 3,5 milhões de investidores pessoas físicas, numa clara expressão da adoção de novas práticas na vida financeira do brasileiro. Ainda que o número represente menos de 2% da população total, expressa uma maior exposição a ativos que vão além da poupança. Com um cenário de taxas de juros baixas, os títulos públicos deixam de ser uma boa opção. Os investidores passam a arriscar mais. Não à toa, neste ano, pela primeira vez, os investimentos em Venture Capital superaram o Private Equity e por aí vai.
As injeções monetárias nos últimos meses, lideradas pela Europa e EUA, fizeram com que se mantivesse um cenário de forte liquidez no mercado internacional [liquidez corresponde à velocidade e facilidade de transformar um ativo em dinheiro]. Tudo isso, também favoreceu — e muito — o crescimento dos SPACs nos últimos meses. 2021, apesar de ainda nos encontrarmos em pandemia, é um ano com muitos recordes.
Do lado dos SPACs, o ano começou com recordes também. O ano de 2021 mal tinha começado e 144 SPACs já faziam IPO, em comparação com 248 no ano passado. O mercado de SPAC está mudando as fintechs de privadas para públicas. A lista dessas empresas está ficando cada vez maior. Qualquer coisa que gere US$ 50 a US$ 500 milhões em receita e com 500.000 a 10 milhões de usuários está se tornando pública. Algo que, em um processo tradicional de IPO [disponível aqui], seria mais difícil — custos, regras e tempo.
Analisando alguns IPOs e SPACs
Na edição #18, falamos sobre o racional por trás dos valuations das fintechs. Somos contadores de história e vendedores de sonhos. Os capitalistas de risco são os principais apostadores neste grande enredo que é o mercado de inovação tecnológica. Algumas startups possuem modelos de negócios totalmente disruptivos, com um potencial enorme de mercado (TAM), desta forma, os capitalistas de risco apostam nessas empresas, na capacidade do empreendedor e sonham junto com eles — essa é a coisa mais fantástica deste mercado. No entanto, na maioria das vezes, o mercado é soberano. Se a história não for boa ou convincente, o mercado precifica abaixo do valuation inicial que o venture capitalist apostou. Isso acontece nos tradicionais IPOs e, digamos que, nos SPACs os empreendedores possuem mais uma chance para provar sua história. Às vezes, não dá certo.
Analisando o terreno
A indústria de fintech é atraente porque está desempenhando um papel disruptivo na entrega de serviços e produtos financeiros. Muitas vezes esta indústria é intensiva em capital e, como tal, busca fontes de capital de custos mais baixos. Além disso, seguindo a lógica dos VCs, à medida que essas empresas amadurecem, elas buscam formas de efetuar o exit — seja vendendo para uma grande empresa do setor (M&A) ou abrindo capital (IPO e SPAC).
Houve 12 fusões SPAC no setor de fintech dos EUA, gerando US$ 52,63 bilhões em volume de negócios até o mês de junho de 2021, em comparação com nove transações totalizando US$ 16,90 bilhões em volume de negócios no ano passado [referência aqui]. Houve apenas uma transação de SPAC-fintech em 2018 e 2019, gerando US$ 1,15 bilhão e US$ 553,6 milhões em volume de negócios, respectivamente.

O sucesso dos IPOs anteriores — como os da empresa de pagamento móvel Square [NYSE: SQ] e da empresa de pagamento holandesa Adyen [EN: ADYEN] —, garantiu aos investidores a confiança de que as fintechs podem sustentar um alto crescimento como empresas públicas. Assim, de um lado temos investidores comprando a ideia, do outro temos empreendedores aproveitando os bons ventos que lhes foram dados.
SoFi (via SPAC)
A empresa de empréstimo estudantil SoFi [NASDAQ: SOFI], que vinha considerando um IPO tradicional há anos, anunciou uma fusão em janeiro por uma avaliação de US$ 8,65 bilhões. As ações da empresa fecharam a US$ 20,80 em 15 de junho, em comparação com o preço de abertura de US$ 21,97 em 1 de junho, o primeiro dia de negociação da empresa. Através do processo de SPAC, a empresa teve o tempo necessário para educar seus potenciais investidores sobre seu modelo de negócio, bem como fornecer projeções financeiras mais detalhadas sobre seu modelo de negócio.
Wise (via IPO tradicional)

Wise [LON:WISE], a empresa de remessas transfronteiriças — que mudou seu nome de Transferwise para Wise durante seu processo de abertura de capital —, teve sucesso em sua listagem pública até agora. De acordo com o relatório do Q1 de 2021, 3,7 milhões de clientes realizaram transações na Wise no primeiro trimestre. Apesar dos bloqueios contínuos em muitos países em todo o mundo, o número de pessoas físicas cresceu 28% em relação ao ano anterior. Pessoas jurídicas, que normalmente usam o Wise para uma gama mais ampla de necessidades, como pagamento e recebimento de fundos de fornecedores, vendedores e clientes, cresceu 56% em comparação com o ano anterior. A receita cresceu 43% no período para atingir £123,5 milhões no primeiro trimestre [referência, aqui]. A Wise é um negócio de pagamentos de crescimento mais estável e rápido, sem nenhum risco de crédito comparado com a SoFi.
Acorns (via SPAC)
O aplicativo de investimentos Acorns também anunciou que havia entrado em um acordo com a Pioneer Merger [NASDAQ: PACX] por uma avaliação de US$ 2,2 bi [referência aqui]. A empresa que oferece um robo-advisor de microinvestimentos, tem uma receita anualizada de cerca de US$ 100 milhões e uma base de usuários pagantes de mais de 4 milhões.
O robo-advisor e a gestão de patrimônio digital começaram nos Estados Unidos em meados dos anos 2000. Até então, o consultor financeiro atendia seu cliente através de um telefone, à medida que a tecnologia foi evoluindo e a automação ficou cada vez mais crescente, os proprietários de empresas de gerenciamento de investimentos passaram a reduzir seus custos fixos. O que garantiu um perceptível avanço a esse mercado. A Acorns, fundada em 2012 para alimentar o mercado de microinvestimentos — e dominar o mercado de quem tinha pouco dinheiro para investir —, aproveitou esse processo de automação. O microinvestimento é essencialmente um hack comportamental para fazer com que as pessoas movam um pouco de seu dinheiro para contas de poupança. O aplicativo é ancorado em um modelo de assinatura e um conceito simplificado de superloja financeira.
Essa estrutura permite que a Acorns pareça ser um investimento rentável para os fundos de ações públicas.
Os seus resultados e potencial fizeram com que ela se tornasse pública de forma sustentável e promissora.
Meliuz (via IPO)
A Meliuz [BVMF: CASH3], fundada em 2011, disponibiliza gratuitamente em sua plataforma cupons de desconto de lojas online e devolve ao consumidor, em dinheiro, parte do valor gasto em compras direto na conta bancária (o famoso cashback). Durante o período de 2011-18, a Meliuz alcançou um alto crescimento com forte engajamento. Em novembro de 2020, a empresa abriu seu capital na B3, movimentando R$ 367 milhões. As ações foram precificadas a R$ 10,00 cada.
Ao final do 1T21, atingiu 7,1 MM de usuários ativos, tendo adicionado 27 mil novas contas por dia ao longo do trimestre, com baixo CAC mesmo sem uma ampla oferta de serviços financeiros
A empresa ainda tem planos de lançar sua própria conta digital, projeto que ganhou maturidade depois da compra da Acesso Bank, em maio deste ano. Os serviços financeiros serão uma conta digital completa, que permitirá cartão de débito e crédito, pagamento de salários, emissão de boletos, PIX até crédito, seguros e investimentos — como parte da estratégia, ela também adquiriu, em julho deste ano, a Alter, uma conta digital que permite a compra de criptomoedas.
Mesmo com o alto crescimento, a companhia apresentou um prejuízo de R$ 6,1 milhões e o Ebitda, uma medida da geração de caixa das empresas, foi de R$ 2,3 milhões negativos nos seis primeiros meses deste ano. Tais resultados, no mercado brasileiro, ainda prejudica as expectativas dos investidores.
Com questões macroeconômicas mal resolvidas, a bolsa brasileira é influenciada por diversos fatores. Tanto que não são apenas as empresas de tecnologia que enfrentam momentos adversos. Com um cenário de aumento dos juros de longo prazo, alta inflação e turbulência política — aumentando o custo de capital — os investidores correm para as empresas mais tradicionais e as companhias de tecnologia são mais impactadas, pois muito de seu valor está no futuro — aquela conversa que tivemos na edição #18, link aqui.
A bolha dos SPACs estorou?
Entre janeiro e junho, os SPACs registraram 332 ofertas públicas iniciais no mercado americano de capitais, captando US$ 98 bilhões, segundo a consultoria Baker McKenzie [disponível aqui]. Em todo ano de 2020, foram 248 IPOs nessa categoria.
Apesar do recorde, há uma realidade bem menos positiva por trás dessa onda. De acordo com um levantamento do Dow Jones Market Data, com base em indicadores compilados pela consultoria SPAC Research, depois do pico dos SPACs observado em fevereiro deste ano, as empresas enquadradas nessa categoria perderam cerca de US$ 75 bilhões em valor de mercado [disponível aqui]. Em agosto, esse recuo chegou à casa de US$ 100 bilhões. As perdas foram concentradas em empresas ligadas a segmentos como energia verde e sustentabilidade.
Um dos exemplos dessa queda substancial é a Hippo Holdings, de seguros residenciais, que foi avaliada em cerca de US$ 5 bilhões quando tornou-se pública, via um SPAC, em março desse ano. As ações da empresa acumulam uma desvalorização de mais de 60% desde então e a companhia está avaliada em US$ 2,92 bilhões.
Considerações finais
A alta liquidez no mercado internacional, o cenário de baixos juros nos últimos anos e a consequente fuga de títulos públicos, fizeram com que houvesse uma adoção maior dos ativos com maiores exposições ao risco. No primeiro semestre de 2021, tivemos um aumento na atividade de IPO, impulsionado pela alta liquidez, entusiasmo dos investidores e o aumento dos SPACs. Fazer um IPO é um dos momentos mais marcantes para um empreendedor, além de destacar sua capacidade de entregar bons resultados, mostra também que o negócio é tão promissor que as pessoas querem fazer parte dele.
No cenário dos SPACs, já temos empresas que podem servir para testar e comparar o desempenho de preços. De acordo com o site SPACs Research, ainda há 38 SPACs em processo de Pre-Deal só no setor financeiro, ou seja, 38 fintechs que, se tudo der certo, podem ser adquiridas e abrir capital na bolsa. Em uma visão geral do mercado, as empresas de pagamentos atravessam menos problemas para passar do mercado privado para o público. Suas receitas são rígidas e as tendências seculares são fortes. Não há dados suficientes sobre neobanks, mas provavelmente aqueles que vivem de assinaturas vão se dar bem, enquanto aqueles envolvidos em empréstimos — como a SoFi — serão precificados abaixo do esperado, uma vez que seu modelo de negócio é mais arriscado. O mesmo serve para o BNPL (mais arriscado) vs. pagamentos (mais estável). Enfim, o mercado, muitas vezes, é soberano. Ele sempre precifica.
Vamos para as
Principais notícias da semana
Mais lenha na fogueira do embate sobre assimetria na tributação entre bancos e fintechs; palco agora são as redes sociais
No final de semana, as páginas nas redes sociais da Febraban, associação que representa os bancões, e da Zetta — uma das associações que representam fintechs no Brasil — foram palco de mais um capítulo no embate entre os dois grupos de instituições financeiras. De um lado, a Zetta — liderada pelo Nubank — postou no seu LinkedIn que “a verdade verdadeira” é que as tarifas dos grandes bancos, que reclamam da perda de competitividade, saltam acima da inflação durante a pandemia, enquanto as tarifas das fintechs são mantidas.
Em resposta, a Febraban atacou de textão: “A verdade verdadeira é que as grandes fintechs gostam mesmo é de pagar apenas “meia entrada” e em nada se diferenciam dos bancos. Aliás, só não são bancos para pagar menos impostos, gerar menos empregos, ter poucas obrigações regulatórias e trabalhistas.
Chilena Betterfly compra fintech Xerpa antes de iniciar operação no Brasil
A insurtech chilena Betterfly, considerada a mais valiosa da América Latina no setor, anuncia a aquisição da Xerpa, fintech de antecipação de salários, logo após levantar US$ 60 milhões em uma rodada Série B.
“Acreditamos que a aquisição da Xerpa é um passo natural para que a Betterfly possa entregar uma oferta integral aos trabalhadores. Estamos construindo uma potencia financeira alinhada ao proposito social nato da Betterfly. Um ecossistema que permite ao usuário melhorar seus hábitos saudáveis, sua qualidade de vida, além da possibilidade de ajudar a outras pessoas.” — Eduardo Della Maggiora, fundador e CEO da Betterfly
Cenário global
BNPL Company Affirm Rolls out Adaptive Checkout
The buy now, pay later (BNPL) network Affirm has launched a new product called Adaptive Checkout, which it says allows merchants on its network to give customers more choices when it’s time to pay.
Early access merchants have seen average cart conversion increases of 26%, as well as a 22% increase in approvals and a 20% spike in sales compared to offering monthly payments solely through Affirm.
Recomendação de leitura 👈
Na última semana, a Atlantico divulgou um report sobre a Transformação Digital na América Latina. Comparado com os outros países, ainda temos muito arroz e feijão para comer. A capitalização do mercado de tecnologia latino americano representa apenas 3,4% do PIB das regiões, enquanto que nos EUA é de 70%. Contudo, o boom de fintechs na América Latina não mostra sinais de desaceleração à medida que os unicórnios crescem e o capital entra.
Saúde e paz,
Walter Pereira