Olá,
Na nossa #19 newsletter da W Fintechs você encontrará sobre:
A primeira bolsa do mundo;
Novas modalidades de abertura de capital;
SPACs e as Fintechs;
E, claro, as principais notícias da semana que passou.
Boa leitura!
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O período das Grandes Navegações foi um dos momentos com maior expansão da riqueza na história econômica. Entre os séculos XV e o início do século XVII, portugueses e espanhóis — e, posteriormente, alguns outros países da Europa — exploraram intensivamente o globo terrestre em busca de novas rotas comerciais. Motivados pelo comércio de ouro, prata e especiarias, o mundo experimentou a expansão comercial. Em busca de mais capital para financiamento do período que foi chamado, tempos depois, de a Era dos descobrimentos, surgiram os bancos e as bolsas de valores para garantir a continuidade da curiosidade dos navegantes.
A primeira bolsa de valores do mundo surgiu em 1531, em Bruges, na Bélgica. No entanto, as primeiras ações de que se tem notícia foram emitidas em 1602, na bolsa de Amsterdã, na Holanda. O comércio de especiarias era extremamente lucrativo, mas as expedições marítimas para buscá-la no Oriente eram arriscadas e caras. Assim, era preciso dinheiro, muito dinheiro, para pagar os custos dessas viagens. Devido ao risco de um investimento tão alto acabar em um naufrágio ou saqueado por piratas, era difícil e oneroso encontrar alguém disposto a bancar as expedições. Então, os mercadores perceberam que era preciso se unir para conseguir colocar seus planos em prática. Surgiu a Companhia Holandesa das Índias Orientais, primeira ação da Bolsa de Valores de Amsterdã. A ideia era dissipar os custos das viagens entre vários investidores diferentes, assim, cada investidor arriscaria uma quantia menor e muito mais acessível [referência aqui].
Caso a viagem fosse um fracasso, perderiam menos dinheiro. Caso fosse um sucesso, dividiriam os lucros proporcionalmente à quantia investida — os chamados dividendos. Com o passar dos anos, pessoas passaram a negociar títulos de dívida, commodities, tulipas (essa é uma boa história!), entre outros, com o principal objetivo de angariar os lucros de suas valorizações. Acabou que isso fortaleceu ainda mais o comércio, uma vez que esses investidores estavam financiando o desenvolvimento e a expansão econômica. O principal objetivo de uma empresa quando ela abre capital em uma bolsa de valores, é justamente financiar seu crescimento. A maioria das empresas é motivada pela possibilidade de captar recursos dos investidores para financiar seus projetos de crescimento e aumentar sua competitividade.
De 1602 pra cá, muita coisa mudou — claro! A tecnologia alcançou patamares que para aquela época seriam considerados bruxaria — e daria, no mínimo, uma visita a alguma guilhotina. Com o avanço da tecnologia e seu consequente desenvolvimento, surgiram novas modalidades de empresas e de abertura de capital em bolsa.
Novas modalidades de abertura de capital
Fazer um IPO é um dos momentos mais marcantes na vida de qualquer empreendedor. É a prova de que se construiu algo tão grande, que desperta o desejo nas outras pessoas de fazer parte daquilo. Na edição passada [disponível aqui], falamos sobre os estágios de investimentos das startups e o objetivo final de um Venture Capital. Quando os venture capitalists transformam uma empresa em um negócio maduro, eles se unem a banqueiros de investimento para explorar potenciais aquisições ou ir para o mercado público (IPO).
No entanto, o custo de abrir um IPO é muito alto e às vezes limitante para empresas do porte de uma startup. Em geral, as startups priorizam seu crescimento em detrimento do lucro, ou seja, muitas abrem mão do lucro para abocanhar fatias cada vez maiores do mercado. De acordo com um levantamento feito pela Boston Consulting Group (BCG), existem no mundo 249 bancos digitais, somente 13 deles geram retorno positivo e esses já nasceram a partir de gigantes da tecnologia ou do varejo.

Quando elas estão na fase de roadshow, momento quando as empresas interessadas em abrir capital na bolsa se apresentam aos potenciais e atuais investidores (banqueiros, por exemplo) para precificar suas ações e validar o valuation proposto, muitas têm seu valor reduzido — abaixo das expectativas iniciais. Algumas desistem no caminho, outras continuam, pois precisam do dinheiro e/ou acreditam que podem aumentar seu valor no futuro.
Neste cenário, surgem os SPACs.
SPACS
Os SPACs existem há décadas, mas ganharam força nos últimos meses devido ao grande fluxo de novos investidores, estímulos e uma política monetária favorável. Embora 2020 possa ser considerado o ano de altos retornos em muitos temas não convencionais, os SPACs também tiveram um retorno massivo. Em termos leigos, o Special Purchase Company (SPAC), também chamado de empresa de “cheque em branco”, é uma empresa de fachada pública que levanta dinheiro de investidores, faz IPO imediatamente, encontra uma empresa privada em estágio avançado e depois funde-se com ela para que esta empresa adquirida agora seja pública.
De acordo com o CB Insights, a receita dos SPACs deste ano foi de US$ 95 bilhões, já ultrapassando o recorde de US$ 74 bilhões de 2020 [disponível aqui]. Olhando do ponto de vista do sponsor do SPAC, é como administrar um VC ou PE, mas com a restrição de poder fazer apenas um investimento. Do ponto de vista da empresa em estágio avançado, é uma alternativa mais rápida e fácil para um IPO.
Como funcionam os SPACs?
O processo de SPAC geralmente ocorre em 3 fases: o SPAC é formado e se torna público; o SPAC identifica e adquire uma empresa-alvo; o SPAC se funde com o alvo adquirido e torna essa empresa pública (processo conhecido como “de-SPAC”). Calma, vamos nos aprofundar:
Tornando-se público através de um SPAC
O sponsor — normalmente uma pessoa ou equipe com experiência significativa em negócios — decide lançar um SPAC. Eles criam uma holding e, em seguida, concluem os registros normais associados à abertura de capital — como a empresa não faz nada, ou seja, não tem negócios operacionais, o processo de registro é rápido e fácil. O sponsor então faz um roadshow, semelhante aos IPOs tradicionais, para tentar encontrar investidores interessados. A diferença aqui é que eles estão vendendo a si próprios, sua equipe e sua experiência, ao invés de uma empresa específica — ou seja, em tese, quanto melhor o time, maior a confiança dos investidores. O SPAC abre capital e negocia em bolsa como qualquer outra empresa de capital aberto.
Adquirindo uma empresa
Agora chegou a hora da caça. Os sponsors buscam por uma empresa-alvo para adquirir. Não há restrições sobre o tipo de empresa que um SPAC pode adquirir, embora muitos destaquem um setor-alvo antes do IPO — em síntese, para melhorar as expectativas dos investidores no processo de abertura de capital. Normalmente, os patrocinadores têm 2 anos para encontrar e anunciar uma aquisição, ou então o SPAC será dissolvido e os acionistas receberão seu dinheiro de volta. Quando eles encontram a empresa, eles fazem um term sheet e negociam o preço de compra e a avaliação da empresa.
De-SPAC
Term sheet feito e preço definido, agora os sponsors apresentam os objetivos e o negócio aos acionistas. Os acionistas iniciais têm a oportunidade de votar na aquisição, o que lhes dá algum recurso se um sponsor escolher uma empresa de que não gostam. Mesmo se a aquisição for aprovada, os acionistas que não gostarem da tese podem resgatar suas ações e ter seu dinheiro de volta — geralmente com juros.
Assim que a empresa é aprovada e todos os resgates forem concluídos, o sponsor pode prosseguir com a aquisição da empresa-alvo. Embora o SPAC já seja público e tenha sido protocolado e aprovado pela SEC, a empresa-alvo também precisa obter a aprovação dos reguladores. Em outras palavras, a empresa-alvo não enfrenta necessariamente menos requisitos regulatórios ao abrir o capital por meio de uma fusão SPAC em vez de um IPO tradicional — é apenas um cronograma mais curto, o que é benéfico para uma empresa que almeja crescimento rápido.
Os dois lados da moeda
De acordo com a Reuters, apesar da enxurrada de SPACs, seu desempenho mediano de mercado até agora tem ficado 15 pontos percentuais abaixo do S&P 500.
Os defensores dizem que os SPACs evitam as taxas exorbitantes cobradas pelos bancos de investimento em IPOs, enquanto os críticos alertam que os investidores pagam um alto custo por meio da diluição das ações durante o processo de lançamento de um SPAC e aquisição de uma empresa-alvo.
Um estudo recente realizado por membros das faculdades de direito da Universidade de Stanford e da Universidade de Nova York [disponível aqui], observou que os SPACs que gastam mais do que outros em pagamentos a sponsors e outras taxas tendem a ver os preços de suas ações cair ainda mais após as fusões com as empresas-alvo.
Os SPACs normalmente vendem as ações por US$ 10 [referência aqui]. Assim, o maior benefício para o investidor está no fato dele comprar uma ação por um preço baixo e depois, com a empresa-alvo adquirida, essa ação se valorizar. Contudo, o que é benéfico também é arriscado, uma vez que a empresa que for adquirida pode não cumprir com as expectativas, mesmo quando aprovada pelos acionistas.
Da perspectiva do fundador, a alternativa mais próxima a um SPAC é um IPO liderado por um banco. Os acionistas existentes mantêm o mesmo potencial de valorização e a empresa torna-se pública de qualquer maneira. Ao contrário de um IPO, porém, o processo para a empresa é mais curto — da ordem de 4-6 meses em vez de 18 para um IPO . Isso torna os SPACs geralmente menos perturbadores e mais próximos de uma rodada de financiamento (VCs, por exemplo) ou de processos de M&A, em termos de despesas gerais da equipe.
Mercado LATAM
No Brasil, a falta de regulação ainda impede o surgimento deste mercado. Em março do ano passado, a CVM começou a fazer uma série de consultas públicas sobre a regulamentação dos SPACs no país. A Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) vem discutindo o desenvolvimento de uma legislação específica, que seria um misto de regras dos FIPs com normas para IPOs.
Na semana passada, o gigante do e-commerce Mercado Livre e o fundo de investimentos Kaszek patrocinaram um SPAC, MELI Kaszek Pioneer Corp, e protocolaram uma oferta pública inicial (IPO) na bolsa americana de valores Nasdaq. Serão 25 milhões de ações ordinárias Classe A, a um preço inicial de US$ 10 por ação.
A companhia tem um “cheque em branco” para investir em uma empresa de tecnologia na região. A MELI Kaszek Pioneer Corp pretende concluir a aquisição dessa empresa-alvo em até dois anos após o IPO. A expectativa é de que o “MEKA” (código de negociação do SPAC) seja precificado em até duas semanas.
SPACs e as fintechs
Na edição passada, falamos sobre o racional por trás do valuation das fintechs. Há imensas oportunidades neste mercado, com capitalistas de risco, banqueiros e, inclusive, SPACs interessados no potencial destas empresas.
De acordo com a FT Partners, apenas no segmento de fintechs, no primeiro trimestre de 2021, 17 companhias de SPACs anunciaram planos de fusão com fintechs, totalizando uma avaliação combinada de US$ 62,39 bi. Esses números são um novo recorde para o setor e superaram os números de todo o ano de 2020, onde 15 empresas de “cheque em branco” se fundiram com fintechs, num valor combinado de US$ 57,53 bi [referência aqui].

Há três coisas que os sponsors se atentam em relação ao mercado de fintechs:
Vertical de produtos: boa parte investem no mercado geral das fintechs, sem nicho específico. Outros, focam em seguros, pagamentos, Open Banking ou gestão financeira;
Posição geográfica: enquanto uns estão procurando alvos em qualquer parte do planeta, outros focam em regiões com um tamanho relevante de mercado endereçável;
Valuation: alguns não possuem limites para avaliar as fintechs; no entanto, há alguns que limitam o avaliação, como o caso da SPAC VPC Impact Acquisition Holdings, que está focada em empresas com valuations entre $800 milhões a $2 bi [referência aqui].
Considerações finais
Desde o estabelecimento dos comerciantes, o mundo vem observando uma maior desconcentração no acesso à capital — primeiro com os mecenas, financiando os artistas, agora com os venture capitalists, financiando os inovadores. Pensar que nos séculos XV e XVII, apenas famílias ricas — como Peruzzi, Bardi e Médici — podiam ter um banco e, hoje, ver empreendedores sem capital abrindo bancos (digitais), deixa nítido uma coisa: democratização no acesso à capital. De famílias ricas a empreendedores sem capital, os capitalistas de risco, banqueiros e sponsors (no caso dos SPACs) representam um momento sem igual no mercado de capitais.
Os SPACs são veículos que captam dinheiro de investidores que acreditam na capacidade dos gestores de encontrar um bom ativo nos próximos dois anos para comprar e levá-lo para a bolsa — de forma muito mais rápida e flexível, do ponto de vista contratual. No entanto, há um lado duvidoso nesta história. Uma série de startups de veículos elétricos, por exemplo, tornaram-se públicas através do SPAC durante o ano passado — embora nenhuma tenha produzido um único veículo para venda. Sandy Robertson, precursor dos “cheques em branco”, deu uma entrevista para o Financial Times no início deste ano onde ele disse estar preocupado com os números de SPACs no mercado e suas respectivas qualidades. Na visão de Robertson, há muitas empresas do tipo para um número limitado de alvos que realmente justificam esse interesse. A captação via SPACs é arriscada, tanto para o mercado em geral quanto para seus patrocinadores. Contudo, o mercado funciona assim (“Investing is inherently risky. Not investing however, is even more risky.”). Enquanto a música tocar, haverá pessoas dançando. Dancemos conforme a música, cientes dos riscos da vitrola parar.
Vamos para as
Principais notícias da semana
Queiroga discute com Banco Central criação do open banking da saúde
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, estuda a criação do que intitulou de “open health”. Seria algo no modelo do “open banking“, só que para planos de saúde. A ideia de Queiroga é que o sistema permita ao usuário autorizar as operadoras a terem acessos a seus dados e fazer a portabilidade instantânea de plano, o que aumentaria a concorrência no setor.
A interlocutores, o titular da Saúde disse já ter se reunido pelo menos duas vezes com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para discutir o assunto.
Nubank junta forças com Creditas e vai virar seu acionista
Em 2012, logo que a Creditas foi criada, o espanhol Sergio Furio, dono e CEO da startup foi se encontrar com o representante do Sequoia no Brasil. Furio queria convencer o homem que tinha o cheque de um dos principais fundos de venture capital do Vale do Silício a apostar na Creditas. Na época, não deu em nada e o representante do Sequoia, um colombiano chamado David Vélez, acabou captando dinheiro para a sua própria ideia. Era um tal de Nubank, que disruptaria o mercado de cartões de crédito e hoje é o maior banco digital do mundo.
“São empresas parecidas e, ao mesmo tempo, opostas”, diz Furio com exclusividade ao NeoFeed. “O Nubank é um banco do dia a dia e a Creditas trabalha em outro segmento, com um tíquete mais alto. Caminhamos de formas diferentes, mas conquistando mercado”, diz ele. Agora, vão unir forças.
Apenas 7% dos brasileiros cadastraram cartão no WhatsApp Pay
Lançado no início de maio deste ano, o WhatsApp Pay ainda não caiu nas graças do brasileiro, como o Pix, por exemplo. Além de estar restrito a transferências entre pessoas que tenham cartão de débito de alguns emissores parceiros, a possibilidade de usar cartão de crédito para compras na plataforma ainda aguarda liberação do Banco Central (BC).
Cenário Global
PayPal acquires Japan’s Paidy for $2.7B to crack the buy now, pay later market in Asia
PayPal Holdings, the U.S. fintech company, announced an acquisition of Paidy, a Japanese buy now, pay later (BNPL) service platform, for approximately $2.7 billion (300 billion yen), mostly in cash, to enhance its business in Japan.
After the acquisition, the Japan-based company will continue to operate its existing business and maintain the brand while the leaders, Paidy’s president and CEO Riku Sugie and founder and executive chairman Russell Cummer, keep their positions.
Recomendação de leitura 👈
Quais são os fatores que levam um país ao sucesso, quando o assunto é Open Banking? Neste artigo, publicado pela Tink, foi discutido isso. Sendo um dos mercados mais maduros para o Open Banking na Europa, que já funciona no país desde 2018, o artigo traz alguns fatores que levaram o sucesso da prática. São eles:
Definição de um único padrão de API, tornando-a legalmente obrigatória para os nove maiores bancos = simplificação da entrada no mercado;
Regulação clara = aumentou a confiança do mercado e os parâmetros para ser criativo;
Foco nos consumidores e líderes de tecnologia, não apenas nas instituições.
Saúde e paz,
Walter Pereira