#65: Silver Economy: o aumento da expectativa de vida e as oportunidades para as fintechs no mercado de 60+
W FINTECHS NEWSLETTER #65: 06/02-12/02
📝Key Takeaways:
Nos últimos 100 anos, a expectativa de vida humana média aumentou significativamente. Esse crescimento, combinado com as taxas de conectividade da população 60+ cada vez maiores, criou um cenário cheio de oportunidades.
A Silver Economy, como é chamada a soma de todas as atividades econômicas que atendem às necessidades dos idosos, está em expansão. Até 2030, espera-se que o poder de compra anual total por pessoas com 60 anos ou mais nas Américas aumente de US$ 4,6 trilhões para US$ 6,3 trilhões. No Brasil, espera-se que a Silver Economy cresça 60% e na Colômbia aumente em 82% até 2030.
As AgeTechs, como são chamadas as startups que utilizam da tecnologia para solucionar os problemas da população 60+, surgiram em um cenário de combinação entre o aumento da expectativa de vida e o aumento da conectividade. Elas atendem diversos segmentos (saúde, transporte, seguros, finanças), e as fintechs também estão observando as oportunidades deste mercado para desenvolver produtos e serviços que atendam a necessidade deste público.
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A velhice nem sempre foi bem aceita socialmente. Na Grécia Antiga, diversos foram os filósofos que acreditavam que a velhice era um mal, algo a ser temido. Titon afirmava que preferiria morrer a envelhecer; Anacreonte dizia que envelhecer é perder aquilo que constitui a doçura da vida; Homero, embora acreditasse que a velhice estivesse associada à sabedoria, dizia que os deuses a rejeitavam 1. O pensamento era até que compreensível para uma sociedade que tinha fascínio pelo corpo jovem e saudável. O envelhecer leva, tempo a tempo, o corpo saudável. O filósofo e poeta PtahHotep reconheceu este processo já em 2.500 a.C no Egito, dizendo que “[…] dia a dia enfraquecendo: a visão baixa, seus ouvidos se tornam surdos, o nariz se obstruí e nada mais pode cheirar […] suas faculdades intelectuais se reduzem e torna-se impossível recordar o que foi ontem”. O fim foi percebido.
Os declínios das funções corporais obedecem a um padrão: a finitude da vida. Ao contrário de bens como celulares e computadores, que sofrem um processo contínuo de desgaste desde o instante que começam a ser utilizados, o corpo animal é diferente: ele nasce, cresce, amadurece e alcança o seu mais alto grau de desenvolvimento, denominado de “flor da idade”, antes de iniciar uma significativa curva descendente — até o seu fim. O economista Eduardo Giannetti definiu bem o que é o envelhecer em seu livro O valor do amanhã. O envelhecer, para Giannetti, é um trade-off, um sacrifício de um valor como contraparte da obtenção de algum outro valor (ainda desconhecido). O processo de envelhecimento é um constante “viver agora, pagar depois”. Isso porque ao longo da vida nosso corpo utiliza todos os recursos disponíveis em seu ápice — a incerteza de estar vivo amanhã, faz com que nosso corpo entenda que todos os recursos disponíveis no nosso corpo hoje, inclusive as células, são escassos e não há justificativa para não usá-los. O futuro importa menos que o presente. O corpo se dispõe a pagar um ônus no futuro a fim de obter uma vantagem no presente. É por isso que ao chegar a velhice, chegamos debilitados. Vivemos intensamente e pagamos algum “preço” depois.
Com os avanços da ciência, a longevidade tem sido cada vez mais real. A expectativa de vida tem aumentado significativamente nas últimas décadas. O próprio termo “terceira idade” é recente — surgiu por volta de 1960, na França, e passou a ser utilizado como uma fase intermediária entre a vida adulta e a velhice, uma vez que a vida adulta prolongou-se e em alguns países já se reconhece a existência da “quarta idade”. No Brasil, a expectativa de vida saiu de 33,7 anos em 1950 para 50,99 anos em 1990. A população idosa cresceu também de forma significativa. Em 1960 existiam 3 milhões de idosos no Brasil; em 1975, chegou a 7 milhões; em 2002, foi para 14 milhões; e desde 2016, o Brasil ocupa a posição de quinta maior população idosa do mundo — e estima-se que até 2030, o número de idosos ultrapasse o total de crianças 2.
A conectividade dos 60+
Engana-se quem acha que os 60+ não estão conectados. De acordo com uma pesquisa da KPMG 3, com 51 países analisados, incluindo o Brasil, este público faz quase tantas compras online quanto os consumidores da Geração X e os Millennials. Só no Brasil, 97% da população com 60 anos ou mais acessam a internet com regularidade 4 — crescimento que ficou notável com o advento da pandemia, que forçou esta parcela da sociedade a se conectar virtualmente para realizar tarefas simples do dia a dia, como pagar contas, conversar com a família, ou realizar compras no mercado.
Esta melhora na expectativa de vida, bem como uma “terceira idade” cada vez mais conectada tornou o cenário propício para o surgimento das AgeTechs, startups que nasceram para ajudar os 60+ a superarem os desafios da longevidade através da tecnologia.
AgeTechs
O ecossistema de AgeTech é diverso, com soluções que atendem desde saúde, finanças, seguros, transporte e cuidados cognitivos.
O fundo 4Gen Ventures, focado em Agetech, estima que as AgeTechs atinjam US$ 2 trilhões nos próximos anos 5. A Silver Economy, como é chamada a soma de todas as atividades econômicas que atendem às necessidades dos idosos, também está em expansão. Até 2030, espera-se que o poder de compra anual total por pessoas com 60 anos ou mais nas Américas aumente de US$ 4,6 trilhões para US$ 6,3 trilhões 6. Os EUA lideram a Silver Economy, mas de acordo com dados do World Data, espera-se que o mercado LATAM também tenha um mercado significativo nos próximos anos. Espera-se que a Silver Economy cresça 60%, no Brasil, saindo de US$ 358 bilhões para US$ 572 bilhões, e na Colômbia aumente em 82%, saindo de US$ 76 bilhões para US$ 138 bilhões até 2030.
As oportunidades para as fintechs
No setor financeiro, as oportunidades também são gigantes. No Brasil, por exemplo, o principal plano para os 60+ é o pagamento das dívidas pendentes7. E visto que no país se aposentar é (e será) um desafio, soluções que atendam essas necessidades podem se diferenciar das demais.
Principalmente porque os desafios que o público idoso enfrenta em relação aos serviços financeiros vão desde a falta de acessibilidade e compreensão das ferramentas financeiras digitais, a vulnerabilidade à fraudes financeiras e a falta de opções de investimento adequadas às suas necessidades financeiras. Além disso, muitos idosos enfrentam dificuldades na utilização de canais de atendimento tradicionais, como agências bancárias, devido à limitações físicas ou de mobilidade. Desta forma, as fintechs podem oferecer soluções que atendam às necessidades desse público, garantindo sua segurança financeira e aproveitando sua participação ativa na economia digital.
As fintechs voltadas para o público 60+ podem se basear em diferentes pilares para fornecer serviços financeiros e atender às necessidades desse público, como:
Acessibilidade: oferecer serviços financeiros acessíveis e fáceis de usar para o público idoso, através de aplicativos móveis ou plataformas online.
Segurança: proteger as informações financeiras dos clientes idosos e garantir a segurança de suas contas.
Investimentos: oferecer opções de investimento personalizadas e acessíveis, como robo-advisors, para ajudar o público idoso a tomar melhores decisões financeiras.
Atendimento personalizado: fornecer suporte personalizado e atendimento humano para clientes idosos que precisam de ajuda com questões financeiras.
Educação financeira: oferecer recursos de educação financeira para ajudar o público idoso a entender melhor suas opções financeiras e tomar decisões informadas.
Ao redor do mundo, diversas soluções surgiram para atender este público.
Educação Financeira
O banco americano Capital One, por exemplo, fez uma parceria com o Older Adults Technology Services e o National Council on Aging para criar uma série de cursos online gratuitos para educar financeiramente os idosos 8.
Investimento
A fintech Kindur foi fundada com o objetivo de ajudar os usuários baby boomers a criarem um plano de aposentadoria sob medida, investindo suas economias. A fintech captou em 2018 US$ 9 milhões.
Home equity
A fintech Figure Technologies oferece uma linha de crédito de home equity (HELOC) em sua plataforma baseada em blockchain em apenas cinco dias após a inscrição.
Fraudes
De acordo com o Consumer Financial Protection Bureau, aproximadamente 3,5 milhões de incidentes de exploração financeira de idosos foram cometidos apenas em 2017 9. Nesses casos, idosos de 70 a 79 anos perderam uma média de US$ 45.300 cada.
Tendo isso em vista, a fintech focada neste público, EverSafe, utiliza machine learning para criar um perfil financeiro de seus clientes, que então usa para identificar sinais de exploração ou maus hábitos nas transações bancárias e de cartão de crédito dos usuários.
Conclusão
Como escrevi na edição #62, o PIB global expandiu-se significativamente nas últimas décadas, a isso devemos muito aos avanços da ciência — e o nosso envelhecimento também. Nunca na história da humanidade tivemos tantas pessoas chegando à velhice. Hoje, cerca de 1 bilhão de pessoas tem mais de 60 anos, muitas delas saudáveis. A expectativa de vida está aumentando, enquanto a natalidade está se reduzindo. Este novo cenário apresenta diversos desafios para governos, empresas e, até mesmo, para os mais velhos. Não a toa criou-se um mercado trilionário que está aproveitando os desafios da longevidade para gerar valor à sociedade.
As estimativas mostram que a Silver Economy estará em grande expansão nas próximas décadas — e estima-se que o mercado da América Latina ultrapasse o mercado americano, hoje tido como líder. As AgeTechs atendem diversos segmentos — saúde, transportes, seguros e etc. —, e no setor financeiro as fintechs também estão aproveitando as deficiências do atendimento das instituições tradicionais para abocanhar parte deste mercado.
Aprenda mais em📚
Saúde e paz,
Walter Pereira
https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/182034/siqueira_clo_dr_assis_int.pdf?sequence=4
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/34438-populacao-cresce-mas-numero-de-pessoas-com-menos-de-30-anos-cai-5-4-de-2012-a-2021
https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg/xx/pdf/2017/01/the-truth-about-online-consumers.pdf
https://cndl.org.br/varejosa/numero-de-idosos-que-acessam-a-internet-cresce-de-68-para-97-aponta-pesquisa-cndl-spc-brasil/
https://longevity.technology/news/agetech-market-slated-to-double-from-1-to-2-trillion/
https://worlddata.io/blog/silver-economy-richer-older
https://cdlvg.org.br/pagamento-de-dividas-e-a-principal-meta-para-os-proximos-2-anos-de-um-terco-dos-idosos-revela-pesquisa-da-cndlspc-brasil/
https://www.capitalone.com/about/newsroom/helping-older-adults-understand-whats-possible-with-online-banking/
https://files.consumerfinance.gov/f/documents/cfpb_suspicious-activity-reports-elder-financial-exploitation_report.pdf