#116: Economia de dados no setor financeiro: um olhar para alguns players. Consolidação está a caminho?
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Em um mercado onde os serviços financeiros se tornam commodities (veja a edição da semana passada👉aqui), o valor passa a estar ainda mais concentrado na forma como os dados são utilizados e transformados em benefícios reais para os clientes.
Bancos e fintechs se transformam em empresas de dados, detendo um ativo muito mais valioso do que transações e saldos: informações que revelam as necessidades, preferências e comportamentos futuros de seus clientes. A estratégia vencedora aqui está em como usar esses dados para criar uma vantagem competitiva que realmente faça a diferença.
Ainda estamos longe do ápice dessa convergência entre dados e serviços financeiros, o que significa que há muitas oportunidades a serem exploradas. Muitos players estão apenas começando a explorar o verdadeiro potencial dos dados, enquanto outros já estão avançados, adotando novas fontes e ferramentas para transformar dados em decisões estratégicas. O futuro pertence àqueles que conseguirem dominar essa convergência com velocidade e precisão.
Os 4 tipos de empresas da economia de dados
Na edição da semana passada, falei sobre os quatro tipos principais de empresas: Data Brokers, B2C Companies, B2B2C Service Providers e Compliance Companies. Hoje, vou aprofundar em quem são, o que estão fazendo e as oportunidades que surgem nesse contexto.
O primeiro tipo: B2B2C Service Providers
Essas empresas atuam como agregadoras de dados, conectando APIs de bancos e fintechs para criar soluções integradas. Ao simplificar o acesso a dados financeiros, elas permitem que esses bancos e fintechs ofereçam produtos e serviços mais personalizados para os consumidores, ao mesmo tempo em que tornam todo o processo mais escalável.
Plaid nos EUA, Tink na Europa, Truelayer no Reino Unido, Brankas no Sudeste Asiático e Belvo na América Latina são alguns dos nomes que estão explorando esse espaço. Vou aprofundar em dois desses nomes: Plaid e Belvo.
Plaid
Para entender o impacto do Open Banking nos EUA, é impossível ignorar a história da Plaid. Fundada em 2011, a Plaid surgiu num momento em que a tecnologia bancária era vista como um diferencial estratégico, mas não uma necessidade vital. A empresa nasceu como uma ponte entre bancos e fintechs, seus principais clientes, traduzindo dados financeiros desorganizados em informações úteis e estruturadas.
O que começou como uma simples API de conexão bancária evoluiu para uma plataforma com mais de 12 produtos. Inicialmente, a Plaid utilizava screen scraping para acessar dados bancários, já que os bancos não ofereciam APIs abertas. Embora essa abordagem fosse funcional, foi questionada por muitos bancos e se tornou inviável a longo prazo. Gradualmente, ela migrou para conexões de APIs — muito mais seguras e alinhadas ao crescimento do mercado.
Mas o que realmente diferenciou a Plaid foi sua estratégia de go-to-market. A decisão de priorizar a experiência dos desenvolvedores — oferecendo APIs bem documentadas e suporte completo — foi o que fez a empresa se destacar das demais, acelerando sua adoção e construindo uma base leal de usuários.
Ao contrário de muitos dos seus concorrentes globais, a Plaid optou por permanecer independente. Enquanto Yodlee, Finicity e Tink foram adquiridas por grandes empresas, redefinindo suas estratégias, a Plaid seguiu outro caminho. Em 2019, a Visa apresentou uma oferta de compra de pouco mais de USD 5 bilhões, mas Zach Perret, fundador da empresa, considerou que o valor não refletia o verdadeiro potencial do negócio. Em 2022, a Plaid foi avaliada em mais de USD 13 bilhões, um salto que validou a visão de longo prazo da empresa.
A proposta da Visa de adquirir a Plaid não foi uma decisão trivial, pois chegou em um momento em que a empresa já expandia suas frentes para além dos dados bancários, com novos produtos como soluções de pagamentos e antifraude. A diversificação foi uma jogada inteligente, posicionando a Plaid não apenas como a infraestrutura de dados financeiros, mas também como um player no espaço de pagamentos.
Ao explorar as mudanças no sistema financeiro dos EUA, a Plaid soube capitalizar o legado do ACH e a introdução do FedNow, o novo sistema de pagamentos instantâneos. Embora o FedNow represente uma nova alternativa de pagamentos, a Plaid, com produtos como o Signal, conseguiu transformar o ACH — um sistema criado por banqueiros no final dos anos 1960 com tecnologia legada — em uma solução quase instantânea, oferecendo uma alternativa mais ágil aos métodos tradicionais. Ou seja, mesmo com a evolução dos novos sistemas de pagamentos, o ACH ainda manterá o seu valor, o que ainda poderá garantir à Plaid sua relevância. Além disso, a empresa tem explorado as oportunidades que o FedNow podem trazer à economia americana.
Belvo
Mais ao sul, a Belvo explora as oportunidades disponíveis na América Latina. A região está longe de ser fácil: a inclusão bancária ainda é algo distante para milhões de pessoas, os dados são muitas vezes desorganizados e pouco padronizados, e a conectividade é fragmentada em muitos países da região.
Fundada em 2019 por dois espanhóis, em 2020 a empresa desembarcou no Brasil e trouxe Albert Morales para coordenar os movimentos no país. No ano seguinte, a empresa captou um pouco mais de USD 40 milhões, onde 50% do capital foi investido na operação brasileira 1. No Brasil, a Belvo apostou na construção de uma base sólida, enquanto tentava entender a configuração do cenário bancário do país. Em 2021, dos seus 60 clientes, 30 já eram brasileiros.
A estratégia para o ano seguinte, 2022, era expandir para Argentina, Chile e Peru. Mas os ventos regulatórios contrários e a redução global de liquidez, trouxe uma revisão nos planos.
A Belvo estreitou seu foco para três mercados principais: Brasil, Colômbia e México. Entre eles, o Brasil oferece as melhores condições, mas enfrenta uma competição intensa. Desde que o Open Finance foi regulamentado em 2021, vários players entraram no mercado, tornando a batalha por participação de mercado ainda mais acirrada.
Essa seleção estratégica de mercado reflete uma abordagem calculada: focar em regiões com alto potencial de crescimento enquanto se adapta às realidades locais. Diferentemente do modelo da Plaid nos EUA — onde a infraestrutura bancária é mais desenvolvida e as soluções podem ser escalonadas uniformemente — a Belvo optou por uma estratégia mais segmentada e adaptada localmente.
Operar na América Latina é desafiador devido a fatores como condições políticas, regulatórias, culturais e de infraestrutura. Por exemplo, no México, mudanças políticas afetam diretamente as iniciativas de inovação do banco central. Na Colômbia, a baixa penetração bancária e o acesso precário à internet dificultam a adoção de plataformas digitais, apesar do apetite dos reguladores à inovação financeira. Enquanto isso, o Brasil combina forte regulamentação e infraestrutura, mas a competição é mais intensa.
Em vez de uma rápida expansão internacional como a Plaid, que agora opera em 18 países, a Belvo se concentrou em três mercados principais e adaptou seus produtos às necessidades específicas de cada país.
Os desafios para ambos
Esse foco na adaptação às especificidades de cada mercado é um contraste com a abordagem da Plaid, que se concentrou em oferecer uma solução global para problemas bancários semelhantes em diversos países. A Belvo escolheu um caminho mais gradual e conectado localmente, construindo uma base sólida antes de expandir ainda mais na América Latina.
Uma diferença fundamental está nos desafios estruturais de suas respectivas regiões, que influenciam diretamente o crescimento e as estratégias de produtos. Assim como a Plaid, a Belvo diversificou suas ofertas de produtos. A diversificação da Plaid em pagamentos a posicionou estrategicamente para receber a oferta de aquisição da Visa. Enquanto o FedNow desafia o produto de pagamento baseado em ACH da Plaid, seu portfólio mais amplo garante fluxos de receita contínuos.
A Belvo seguiu uma trajetória semelhante. Em 2023, a empresa adquiriu uma startup de pagamentos e expandiu suas ofertas em torno do Pix, lançando produtos como Pix Recorrente, Pix Biometria, Pix Automático e Transferências Inteligentes. Esse movimento posiciona a Belvo não apenas como uma empresa de dados, mas também como um player no espaço de pagamentos.
Para provedores de serviços B2B2C, expandir seus portfólios de produtos parece estratégico. Eles geralmente começam com produtos de dados, passam para pagamentos e, mais tarde, exploram áreas como prevenção de fraudes. Como escrevi na semana passada, os pagamentos são uma mina de ouro para dados. Quanto mais transações, mais dados. A Plaid reconheceu isso, diversificando para manter sua vantagem estratégica. A Belvo fez algo semelhante, alavancando o Pix para expandir seus produtos. A lógica é simples: quem controla o fluxo de dinheiro também controla o fluxo de dados.
O segundo tipo: B2C Companies
Aqui estão os bancos e as fintech que aproveitam das ferramentas disponíveis no mercado, como data brokers, compliance companies e B2B2C Service providers, para transformar dados de consumidores em produtos financeiros personalizados.
Esses dados servem como combustível para um nível de personalização que vai além do básico. Eles permitem que as empresas usem cada interação como uma oportunidade para aprimorar a experiência do cliente. Quanto mais dados tiverem, maior será sua capacidade de criar experiências contextualizadas, antecipar necessidades e garantir uma vantagem competitiva significativa de longo prazo.
Na edição #114, explorei como as instituições podem utilizar tanto os dados que já têm internamente quanto dados de fontes externas como Open Finance e data brokers. À medida que fontes externas se tornam mais acessíveis, a diferenciação não está mais no acesso aos dados, mas em quão inteligente e estrategicamente eles são usados.
O terceiro tipo: Data Brokers
Os Data Brokers atuam como intermediários no mercado de dados, comprando e vendendo dados do consumidor para vários propósitos, como a criação de perfis de crédito detalhados. Esses dados, geralmente obtidos de instituições financeiras ou fontes públicas, são negociados sem supervisão clara para os consumidores. No Brasil, empresas como Serasa Experian e Boa Vista se enquadram nessa categoria, alavancando dados para melhorar a análise de crédito e o gerenciamento de risco.
Em 2010, os Data Brokers ganharam um novo capítulo no Brasil: o Cadastro Positivo foi introduzido como uma solução para expandir o acesso a dados e melhorar a disponibilidade de crédito no país. Em 2017, o apoio de grandes bancos — Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, Itaú e Santander — levou à criação do Quod. No entanto, a realidade acabou sendo bem diferente. A ferramenta se mostrou ineficaz e potencialmente arriscada para os consumidores, pois permitia o uso indevido de informações sem controle ou supervisão adequados. No final das contas, a promessa de transformar o crédito no Brasil acabou sendo apenas mais um passo no processo de coleta e comercialização de dados pelos principais players do setor.
Algumas empresas nesta categoria estão se reposicionando estrategicamente adquirindo concorrentes e diversificando operações, como entrar no mercado de prevenção de fraudes, para se alinharem às novas regulamentações de dados. O principal desafio aqui é equilibrar a coleta de dados com a necessidade de atender aos requisitos regulatórios recentes.
O quarto tipo: Compliance companies
Plaid e Belvo inicialmente operavam em mercados não regulados que mais tarde ganharam regulações específicas. Em contraste, as Compliance Companies, como Iniciador e Finansystech, capitalizam as oportunidades geradas pela regulamentação. Essas empresas não apenas garantem a conectividade de API de acordo com os padrões regulatórios, mas também oferecem serviços de consultoria para bancos e fintechs, ajudando-os a permanecer em conformidade com as regulamentações.
Este mercado é promissor, especialmente com o avanço das regulamentações, mas também apresenta desafios. Para garantir crescimento sustentável e geração significativa de receita, essas empresas precisarão diversificar suas ofertas. Isso pode significar expandir para novos serviços ou adaptar seus modelos de negócios, semelhante ao que vimos com os B2B2C Service Providers, que se expandiram além dos dados para explorar pagamentos, prevenção de fraudes e outras soluções.
Guiadas por tendências regulatórias, uma alternativa interessante para essas empresas seria expandir para novos mercados internacionais. No entanto, isso envolveria desafios culturais e um entendimento mais profundo de diferentes regulamentações regionais, exigindo maior adaptação em suas estratégias.
A consolidação está a caminho?
A pergunta que sempre surge no setor, quando vemos tantas camadas e players em funções distintas, é: haverá consolidação? Ou seja, quem vai se destacar e dominar o mercado? Enquanto algumas vertentes podem ser dominadas, outras ainda serão campos de batalha e três fatores podem ser considerados aqui.
Primeiro, ao analisar as diferentes estratégias adotadas pelas empresas que operam no ecossistema financeiro e de dados, uma das distinções mais notáveis está na maneira como elas abordam os desafios estruturais e a adaptação às diferentes regulamentações e mercados. Para as empresas do tipo B2B2C, como Plaid e Belvo, a principal barreira de entrada está em construir soluções que integrem dados financeiros de forma eficiente e escalável, enfrentando desafios como dados desorganizados e a falta de APIs abertas, especialmente em mercados emergentes.
O segundo fator é a inovação. Empresas nas categorias B2C, B2B2C e Compliance estão no centro de uma revolução tecnológica no setor bancário. À medida que as regulamentações evoluem rapidamente para acompanhar a inovação, oportunidades significativas aguardam os participantes que agirem rápido. A necessidade de inovação sempre prevalecerá, mas isso criará um mercado com muita volatilidade onde apenas alguns conseguirão se manter no longo prazo — especialmente aqueles com recursos financeiros limitados.
A diferenciação é outro fator relevante e que transforma essa busca pela consolidação em um verdadeiro campo de batalha. Empresas que atendem ao consumidor final, como as B2C, vão precisar entender que elas não estão competindo apenas por dados, mas sim pela experiência. O consumidor quer algo mais, e as empresas que sabem oferecer uma experiência personalizada são as que vão sobressair. Ao contrário dos Data Brokers, que centralizam dados para um público corporativo, as B2C Companies precisam construir uma conexão direta e genuína com o consumidor. Já as B2B2C vão precisar estender cada vez mais sua esteira de produtos, como vimos algumas nascendo como soluções de dados e caminhando para pagamentos — ou seja, dominam o fluxo do dinheiro e o fluxo dos dados.
Algumas empresas escolhem trilhar seu próprio caminho de forma independente, sem se preocupar em ser adquiridas, pois sabem que ao dominarem a arte de criar valor com dados, o que poderia ser apenas um “bom negócio” se transforma em uma verdadeira mina de ouro.
Portanto, enquanto algumas vertentes podem acabar se consolidando devido ao controle de dados, a verdadeira batalha no mercado está nas empresas que sabem inovar e oferecer valor real ao cliente final. O futuro do setor será definido por quem conseguir equilibrar controle, impacto e, acima de tudo, a capacidade de oferecer experiências diferenciadas e personalizadas. Esse é um campo onde a consolidação pode acontecer, mas não por controle, e sim por adaptação.
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Saúde e paz,
Walter Pereira
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https://exame.com/insight/fintech-belvo-225-milhoes-open-banking/p